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Cerca de 40 milhões de brasileiros poderão ter seus celulares bloqueados até o fim deste ano. A medida vai atingir quem comprou aparelhos sem certificação da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel, que regula o setor), cujo registro não seja válido. Esse registro, chamado de Imei — sigla em inglês para Identidade Internacional de Equipamento Móvel —, é único para cada aparelho, como o número de chassi de um carro. A medida se estende a outros aparelhos que utilizam chip para se conectar à internet, como laptops, computadores, tablets e babás eletrônicas.
O objetivo é combater o comércio paralelo, principalmente de celulares. Nos últimos anos, vem crescendo o número de lojas, camelôs e sites que vendem modelos sem homologação, falsificados ou roubados. Esses modelos, mais baratos, tornam o aparelho mais acessível à população de baixa renda — e, em um cenário de desemprego elevado, são essenciais para quem precisa de bicos para sobreviver. A previsão atual da Anatel é que, no dia 15 de setembro, as empresas de telefonia avisem, via mensagem de texto (SMS), os clientes de que o aparelho não é regularizado e será bloqueado. Ou seja, a linha e o pacote on-line serão suspensos. O bloqueio poderá ser feito 75 dias após a notificação. A data original para informar ao consumidor era 30 de julho, mas foi adiada, na última sexta-feira, a pedido do Sindicato das Empresas de Telefonia do Brasil (SindiTelebrasil), conforme antecipou o colunista do GLOBO Lauro Jardim.
Para Rafael Zanatta, pesquisador de telecomunicações do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), o pedido de adiamento do SindiTelebrasil coloca dúvidas sobre o diagnóstico da Anatel e indica que os fabricantes dos aparelhos poderiam adotar medidas técnicas para evitar fraudes nos Imeis. As empresas, por sua vez, negam ser responsáveis e demandam maior repressão à fraude em Imeis para revenda de celulares furtados ou roubados.
— Toda essa polêmica indica que não há consenso entre o setor privado e muito menos com as organizações civis, que não foram devidamente consultadas sobre o prazo de desligamento de celulares não homologados — diz Zanatta.
CELULAR IMPORTADO PODE ESTAR REGULAR
Para identificar se o seu celular tem o Imei, confira se há um selo da Anatel na bateria do aparelho e/ou no manual. Mas quem comprou o celular no exterior não terá o aparelho bloqueado se o telefone houver sido certificado por alguma organização estrangeira que integre a Associação Internacional do Setor, a GSMA, da qual o Brasil faz parte. Todos os grandes fabricantes estão nesse grupo.
Fabro Steibel, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS-Rio), ressalta, no entanto, que é difícil garantir ao consumidor que ele estará livre de problema, principalmente quando o aparelho é comprado pela internet:
— O único caminho seguro é, antes de comprar um celular, pedir para ver o aparelho, abrir a caixa, ver o selo da Anatel, verificar o Imei, ir ao site da agência para ter certeza de que o celular é homologado. Só assim para ter segurança total.
Steibel explica que o bloqueio é feito pelo Imei, por isso não importa o local onde o aparelho foi comprado, mas sim se este é homologado pela Anatel ou não. Quando um dispositivo móvel usa a rede de uma operadora, seu Imei fica registrado. Já a homologação é uma certificação de que o celular está dentro dos parâmetros técnicos exigidos pela agência. Os aparelhos autorizados recebem um selo da Anatel, que pode estar na embalagem ou no próprio dispositivo.
— O Imei não é feito de forma que o usuário comum possa alterar o número, mas há diversas formas de “crackear” isso, e um usuário avançado é capaz de fazê-lo. Cria-se, assim, um mercado ilegal de desbloqueio, muitas vezes operado por pessoas ligadas a roubo de celular, aumentando a insegurança da proteção de dados contidos nesses dispositivos móveis — alerta Steibel, explicando que “crackear” é uma técnica de desbloqueio de aparelhos.
Eduardo Levy Moreira, presidente executivo do SindiTelebrasil, também se preocupa com o aumento do furto de celulares:
— O setor apoia toda e qualquer medida que venha a impedir a entrada no mercado de produtos não homologados, mas, do modo como está sendo feito, o bloqueio desses aparelhos pode estimular a ida dos consumidores para o mercado paralelo.
O bloqueio, que está em discussão há cinco anos por um grupo de trabalho dentro da Anatel, começou a ganhar força após denúncias de que sites na internet estavam vendendo aparelhos irregulares, com Imeis falsificados ou clonados.
— Esse é um assunto que pode prejudicar o consumidor. Um aparelho clonado e irregular traz problemas para as empresas de telefonia, pois sobrecarrega a rede, e, para o usuário, fica a percepção de que o serviço prestado é ruim. Hoje, há muitos sites na internet vendendo os chamados microcelulares irregulares — disse uma fonte ligada ao governo, que não quis ser identificada.
Levy refuta a afirmação de que esses celulares irregulares teriam algum efeito sobre a rede:
— Como a qualidade dos componentes é baixa, o que pode acontecer é que o consumidor tenha uma percepção da qualidade do serviço ruim, pois ele vai ter menor velocidade para fazer download e pode ter uma cobertura menor no sinal de voz. Mas isso não tem influência sobre a rede.
FABRICANTES DEFENDEM CRIMINALIZAÇÃO
O SindiTelebrasil estima que, todos os meses, um milhão de novos celulares irregulares entre no mercado. Parte desse total tem origem no roubo ou furto. Neste caso, são celulares regulares cujo Imei foi adulterado por organizações criminosas, que se aproveitam da vulnerabilidade hoje existente nos aparelhos comercializados no país.
O diretor do ITS-Rio ressalta que todos sabem que roubar os dados pessoais de alguém pelo celular vale dinheiro. Assim, quem tiver seu celular bloqueado depois de 15 de setembro e procurar alguém que faça o desbloqueio pode ter seus dados pessoais roubados — ou seja, todos os seus contatos, fotos, mensagens e senhas podem parar no mercado negro.
Zanatta, do Idec, reforça, ainda, a necessidade de se desenvolver um plano para evitar ruídos na informação aos cidadãos, que deve ser elaborado pelo corpo técnico da Anatel e alinhado com todo o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor.
Para Steibel, os únicos que ganharão com o bloqueio são os fabricantes sediados no país:
— Se o problema é combater o celular pirata, a Anatel deveria fazer uma parceria com a Polícia Federal para ampliar a fiscalização nas fronteiras.
Zanatta destaca também que, no caso de aparelho comprado no mercado oficial que tenha um Imei fraudado, não há que se falar em responsabilidade do consumidor.
— Trata-se de um vício do produto, nos termos do Código de Defesa do Consumidor. Por se tratar de bem durável, o prazo para reclamar é de 90 dias. O consumidor tem direito a receber outro celular sem custo — explicou.
Em nota, a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) diz que as afirmações de que o bloqueio de celulares irregulares vai empurrar os consumidores para o mercado de aparelhos roubados não condizem com a verdade e são contraproducentes para um debate que envolveu indústria, operadoras e órgão regulador. A Abinee afirmou que mais de 20 países já implementaram o bloqueio, com resultados efetivos. A associação defende a criminalização da clonagem ou adulteração do Imei, a exemplo, do que acontece com o chassi de carros.
TIRE DÚVIDAS
Como saber se meu celular está irregular?
É preciso saber o número de identificação do celular, chamado de Imei.
O que é Imei?
O Imei é a sigla em inglês para International Mobile Equipment Identity, ou Identidade Internacional de Equipamento Móvel. É como o número do chassi de um carro: único para cada celular.
Onde eu verifico o Imei?
Esse número pode ser verificado na caixa do celular ou em um adesivo que fica colado na bateria do aparelho. Outra dica é digitar a sequência *#06# no celular e apertar a tecla para ligar.
Aparelhos comprados no exterior são irregulares?
Celulares comprados no exterior não são considerados irregulares se o aparelho houver sido certificado por alguma organização estrangeira que dê tratamento recíproco ou que integre o Memorando de Entendimento do qual o Brasil seja signatário. Neste caso, o celular apresentará o Imei.
O que observar na hora da compra?
Conferir se o número que aparece na caixa do celular (o Imei) é o mesmo que aparece ao discar *#06#. Se esse número não for igual, o celular é irregular. No selo de certificação da Anatel, há informações como o número de certificação, o ano de fabricação e o fabricante. Exija e guarde a nota fiscal e o termo de garantia.
fonte: o globo